A Rota Farroupilha proporcionou uma nova paixão: São José do Norte.


Sabe aqueles lugares dos quais já ouviu falar e jamais pensou em conhecer? Pois é, às vezes precisamos expandir os horizontes e, nesse caso, os alarguei bem ao sul do Rio Grande do Sul: São José do Norte


Sabem onde acaba a BR 101, a temida rodovia da morte? Dizem que é em São José do Norte, mas como boa gaúcha considero que nada morra por essas bandas, mas que nasça - vai ver que só foi construída ao contrário, né?




A antiga Península de Pernambuco ou Barranca do Norte é banhada pelas águas da Lagoa dos Patos e pelo oceano Atlântico e sempre foi considerada um ponto estratégico, por estar bem ao sul e sua barra ser a entrada para os mares, lagoas e rios do Brasil. Nessa perspectiva, aproximadamente em 1720, aporta por lá a "Frota de Magalhães", para fincar bandeira. A partir daí se tem o inicio da povoação, do estabelecimento de estâncias e da criação de gado. Estava firmada a posse do extremo sul pelos portugueses. Mas como nem tudo são flores em nossa história, em 1763 os espanhóis invadem Rio Grande e São José do Norte, sendo que a última é retomada pela Coroa portuguesa em 1767. Em 1822 foi elevada a categoria de freguesia, sendo reconhecida como município em 1832. 


Hoje, a pequena comunidade distante 372Km de Porto Alegre, divide com Rio Grande as atividades do Polo Naval.


Pode ser acessada via BR 101 ou, por balsa e lanchas, a partir de Rio Grande. A base econômica do município ainda está baseada no extrativismo vegetal (plantações de Pinus) e na pesca industrial de alto mar (feita com navios acima de 12 toneladas). Entretanto, os empregos ligados ao polo naval tem se multiplicado e, com o investimento de 420 milhões na construção de uma plataforma de petróleo bruto recentemente instalada, passará a ser a base da economia e da geração de empregos da região. Os moradores estão esperançosos no crescimento da cidade. 






Chegamos cedinho, na lancha (catamarã) que faz a travessia Rio Grande - São José do Norte - Rio Grande, na mesma que retomamos no final do dia, bem mais iluminado. Saímos do porto velho num amanhecer sombrio, mas já sem chuva, deixando a camionete em Rio Grande.


Fomos recepcionadas pelo Alex Sandro, agente de viagens, proprietário da LagunaSul Gentilíssimo ele nos levou para conhecer a cidade e o balneário, muito procurado nos meses quentes. E fomos encontrando cores.



Tons, numa manhã fria e nublada.






À medida que rodávamos as histórias iam sendo contadas. Pioneiros, estancieiros, lutas e sobrevivência, da riqueza de uma região ao empobrecimento e desse aos novos tempos, que parecem finalmente aportarem por lá. 

Esse é o farol mais antigo do Rio Grande do Sul. Observem que interessante as amarras estruturais do Atalaia, conforme engenharia de 1820. É, o senhor já observava a movimentação de tropas bem antes da Revolução Farroupilha.





Um barco, um navio, mais uma voltinha e outro barco.




Ah, como gosto de fotografar barquinhos.


De carro seguimos por estradas asfaltadas e de areia, percorremos a beira mar por quilômetros e chegamos aos molhes da barra. Se no dia anterior não conseguimos brincar nas vagonetas dos molhes de Rio Grande, em São José pulamos de pedra em pedra. 




O passeio é delicioso e, com o estabelecimento da empresa de turismo, o potencial turístico da região se fortalecerá. 



Enquanto uns passeiam, outros trabalham, curiosos pelo movimento de tantas câmeras nas janelas do automóvel, certamente.



Para azar do proprietário e sorte das fotógrafas, havia um barco encalhado na praia. Há dias estava preso por cabos, numa tentativa de resgate.



Depois da parada, mais alguns quilômetros acompanhando as ondas e os pássaros.



O passeio estava ótimo, mas era chegada a hora do almoço, pois depois tínhamos um compromisso agendado com Fernando Costamilan.

Fomos recebidas no Brisamar Restaurante, a mais tradicional opção da cidade. Já vou avisando: faz jus a fama de servir frutos do mar deliciosos.



Com o polo naval acelerando os trabalhos, o sistema de buffet do local estava em pleno funcionamento, mas tínhamos uma mesinha reservada e, apesar da espiadela nas dezenas de opções self-service, fomos  logo pedindo o famoso kit de frutos do mar - siri na casquinha, camarões, bolinhos e filé de peixe, acompanhados de pirão.



Estávamos em quatro e pedimos apenas um kit e uma casquinha extra de siri. Confesso que seria suficiente, apesar de garantirem que serve apenas três pessoas. E a gula, se faz o que quando ela salta e saltita pelos pratos? Melhor sucumbir e o fizemos com uma porção extra e deliciosa de camarões.



Conversamos um tantinho, aproveitamos as tantas e tantas histórias que a proprietária tinha para nos contar e partimos, pois já nos esperavam. Ops, só dá uma espiadela nos precinhos.



Chegamos na sede do Ministério Público, onde o Instituto Histórico e Geográfico de São José do Norte promoveria a abertura da 1ª Semana em Memória ao Combate de 16 de julho de 1840.


A cidade, com sua importância portuária e proximidade com Rio Grande, da qual é separada por um estreito braço de lagoa, foi palco de um das mais sangrentas batalhas da Revolução Farroupilha. Com a tomada de Porto Alegre pelos idealistas republicanos em 20 de setembro de 1835, quando foi deflagrada a Guerra dos Farrapos, os legalistas fogem por água e se estabelecem em Rio Grande. Os serviços alfandegários são transferidos de Porto Alegre para a nova capital imperial da província.

Os revolucionários sempre ambicionaram a tomada de Rio Grande, única maneira da República Rio-Grandense se fortalecer e estabelecer, em definitivo. Ocorre que para lá foram movidas esquadras da Coroa e muitas tropas, o que transformou a região no maior e mais bem guarnecido quartel imperial. Enquanto os republicanos se tornavam imbatíveis nos combates em terra, pois eram homens do campo, conhecedores dos segredos das matas e da lida com os cavalos, os imperialistas eram os senhores das águas, com suas técnicas de guerra, fartura de armamentos e imponente frota naval. Depois das tropas revolucionárias de Onofre Pires terem passado pela cidade em 1836, se abastecendo de gado, Bento Gonçalves, José Garibaldi e aproximadamente 1200 homens retornam em 1840 - era chegada a hora de tomar o porto cuja barra e braço de mar davam acesso ao porto de Rio Grande.

A batalha da madrugada de 16 de julho teve inicio com uma primeira vitória dos revolucionários, que em número bastante superior, tomaram o porto de São José do Norte. Entretanto, forças deslocadas de Rio Grande, em lanchões, se multiplicam e pela manhã Bento resolve retirar as tropas. Não havia mais como resistir. Será? Domingos Crescêncio acreditava que incendiar a cidade poderia ajudar a reverter a situação ou, pelo menos, causar sérios prejuízos à administração portuária imperial. Bento não titubeou, não era um assassino, mas um revolucionário - não sacrificaria civis indefesos em sua luta, deu ordens e partiram, deixando para trás apenas os cadáveres daqueles que pelearam. Sucumbia ali, talvez, a oportunidade mais significativa de estabelecerem de forma irreversível a República.

Fernando Costamilan é um apaixonado pesquisador, historiador dedicado, que tem promovido com o grupo do Instituto ações anuais que visam dar a conhecer a importância histórica da cidade. Anualmente são organizadas nas noites frias de 16 de julho cavalgadas para lembrar a luta, homenagear os mortos e relembrar os ideais revolucionários. A cidade tem renascido pela história, com a população entendendo a importância do restauro de seus prédios e largos históricos e, também, do desenvolvimento turístico para a região.




Participamos do primeiro dia do seminário, que contou com palestras do jornalista e escritor italiano Mauro Gavilucci, autor do livro "Caminhos de Garibaldi" que narra a saga do combatente na América do Sul; do presidente do Instituto Menotti Garibaldi, de Mostardas e da pesquisadora e conservadora arqueológica da Universidade Federal de Pelotas, Susana Dode - em reformas feitas pela cidade, especialmente nas casas mais antigas, muitos objetos tem sido encontrados, como pontas de lanças e outros e é de uma dessas que a professora foi narrar o trabalho de restauro desenvolvido.




Sabíamos que a hora de partir para o porto se aproximava. O Alex Sandro, que nos esperava, havia avisado que deveríamos tomar a lancha das 17h30min, para aproveitarmos o por do sol. Sim, o safado do sol havia aparecido no inicio da tarde e nos acompanharia pelas águas na volta.




Mais uma passadinha no centrinho histórico, agora com sol, para mais fotos. A Igreja de 1890 é linda, não?





E o casario? As obras de restauro já são perceptíveis.




Gosto quando encontro os lindos casarões reformadinhos, bem conservados e prontos para permanecerem, firmes e fortes, por muitas e muitas gerações. Mas ali, na pequenina guardiã das águas mais ao sul do sul do Brasil, os descascados me encantaram.






Enquanto passava por eles, com aquelas tintas se abrindo em flores, pareciam falar, contar histórias. Talvez por não estarem abandonados, por terem a vida de seus moradores a lhes dar expressões e sons, por detrás dos portões.




Inexplicável, mas pareciam fazer sentido em meio as histórias de lutas, mortes e sobrevivência. Testemunhas da história, com suas dores e mazelas, mas com muita vida. O que acham do Solar dos Imperadores?




E quando adoçamos o olhar, nos permitimos, os presentes se mostram.




Hora da partida, de puxar a câmera fotográfica e deixá-la brincar com as cores e tons proporcionados pelo entardecer. Me entreguei ao encanto e, até desembarcar em Rio Grande, me deixei apaixonar.


Um pouco do pequeno cais e sua vida, os barcos que chegam...




... os barcos que partem.




Enquanto uns trabalhavam...




... eu admirava o entorno, as luzes e os reflexos.







Motores ligados, o balanço gentil da lagoa e a cidade se abre aos nossos olhos, depois de ter se escondido com a cerração pela manhã. Ela se exibiu na despedida, como quem diz "volte, te esperarei"!




E fomos deslizando suavemente, enquanto avançávamos em direção de Rio Grande, que logo ali do lado já se exibia para as encantadas blogueiras.




Talvez fôssemos as únicas turistas naquele frio final de tarde de inverno, havia muitos trabalhadores, mas certamente éramos as criaturas mais encantadas que aqueles homens hão de ter visto nos últimos tempos.





Quando São José desapareceu na linha do horizonte, fui para a proa e não me dei por vencida pelo vento frio do anoitecer. Deixei que bagunçasse em definitivo meu cabelo (nem queiram imaginar, só a tesoura reparou o estrago daquele dia), mas respirei aquele ar puro enquanto o olhar se banhava de laranja.




A travessia São José do Norte - Rio Grande ganhará, no futuro, um post exclusivo por aqui, pois é dos espetáculos mais belos que já presenciei na vida. Tão perto de casa, como pôde ficar tanto tempo tão longe do olhar?

São José desapareceu na linha escura do horizonte sombrio, ao mesmo tempo em que Rio Grande surgia nas cores fortes daquele cair de tarde.




Tchau SJN, linda. Oi Rio Grande, esplêndida.

O tour pelas praias do balneário e pela cidade, bem como o almoço, nos foram oferecidos em sistema de parceria,
mas as opiniões aqui expostas não
sofreram qualquer influência.

 A viagem #RotaFarroupilha é um projeto do Territórios e do As Peripécias de uma Flor, em parceria com os blogs Café Viagem e Mochilinha Gaúcha, que contou com as participações especiais de Andarilhos do Mundo e da jornalista Criz Azevedo. O roteiro teve o apoio de empresas regionais como BC&M Advogados e Agropecuária Sallaberry, além do suporte do Sebrae Costa Doce e de algumas secretarias de turismo. A viagem usou como base o Caminho Farroupilha elaborado pelo Sebrae RS e oferecido, como pacote turístico, pela Tchê Fronteira Turismo, de Bagé/RS.
 

11 comentários

  1. Esse fim de tarde é lindo demais! O sul tem lugares lindos!

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    1. As luzes e seus tons tornaram a viagem ainda mais deliciosa! BjO!!

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  2. Lindas fotos! São José do Norte tá no meu imaginário como o fim da linha (ou o começo), o idílico lugar de paisagens planas que ninguém conhece. Agora você conhece, e eu também pelo seu olhar. Obrigada.

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    1. Que delicia, Poliana. É daqueles lugares que não pensamos em conhecer e quando surge deixa só encantamento. BjO!

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    2. Convidamos a todos para descobrir os encantos desta terra!!!

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  3. Que fotos lindas! Adoro os casarios... e os barquinhos! Salivei com a casquinha de siri! E a tua poesia é sempre muito gostosa de se ler! Bj

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    1. Ah, que gostoso ler isso. Obrigada, querida. Bora fazer um bonde de gaúchas para curtir as águas doces? BjO!

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  4. Adorei o chão da igreja, o pôr do sol e o casario antigo - bom saber que a população está se preocupando mais então quando eu visitar, provável que estejam melhor conservadas!

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  5. Pare o mundo agora com essas fotos!!!! LINDAS!!!!!
    Sempre falo que vou voltar... Espero que isso aconteça até 2017. Dessa vez quero conhecer muita coisa por aí ;)
    Bjs

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  6. É tão bom quando encontramos esses 'achados' não turísticos - e melhor ainda pertinho de casa. Adorei o post e deu vontade de ir conhecer o fim/começo da 101, mas algumas coisas me chamaram a atenção:

    1- para tudo com essas fotos de comida... é hora do almoço e eu quase mordi a tela do computador!
    2 - fotos de portas e janelas <3 também piro nisso =)
    3 - e essas cores no fim de tarde! Pra fechar com chave de ouro MESMO!

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  7. Que foto linda aquele barco encalhado!! É muita sorte mesmo. Rs. Adorei o post Paula, como sempre é uma aula a cada leitura.

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