E Sampa sempre ganha meu coração, é uma paixão que se renova, uma cidade que me chama. Dessa feita também me chamou, mas o encontro não seria com ela, mas com Cazuza - o poeta das madrugadas. 



Fui encontrá-lo, doar um pouco de tempo e receber encantamento. Lá estava ele a nos esperar, em várias nuances, em muitas cores e em rasgados sons, no Museu da Língua Portuguesa. 


Como imaginar que teríamos momentos a sós com ele, não é mesmo? Dividimos a tarde com centenas de apaixonados, dos 0 aos 90 anos. Mas sabe que foi bom? 


A Bahia foi eleita nosso destino de verão, mas um destino temático, cheio de simbolismos. Foi mais do que rodar "Pelos Caminhos de Jorge", foi também curtir um pouco de sua religiosidade, do sol, de suas praias. Foi um misto, um roteiro apenas com os destinos traçados, sem limites, para ser vivido de acordo com o clima, com o momento. 



O clima de curtição se instalou quando chegamos a Trancoso, momento a partir do qual rasgamos o roteiro e só sabíamos o dia e hora do voo de retorno ao Sul. Era o momento de conversar com as ondas, ficar ao sol, curtir um banho de mar, sem relógio. Saímos das páginas de Jorge e caímos na Vida, fomos em busca de prazeres mundanos, de preguiça. 


O Quadrado nos proporcionou vida de interior, de sentar e ver o Mundo passar. De se perder das horas conversando, de andar, de comer uma pipoca, uma tapioca, tomar muitos sorvetes. E como é bom andar sem pressa e sem rumo... 




E a Arte daquela Terra? Chega pelas mãos dos índios, ou dos muitos artistas que ali se estabeleceram, com suas telas, esculturas, muita arte em madeira e alguma coisa em cerâmica e vidro. 




“Quem tudo tem, na verdade...

Eu jamais desejei ter tudo, porque sempre desejei o infinito, o buscar, o empreender...
Um empreendedor jamais chega ao fim, ao tudo, ele vê o que está por vir...
Para quem cada conquista é o fim, o tudo, perde de viver o que virá...
Se não tens a capacidade de sonhar com o que virá (sabendo que pode não vir), jamais serás um construtor...
Eu sou um construtor.
Construtor dos sonhos que realizei, mas que jamais foram o fim e sim o princípio do que virá.
Construtor de histórias, porque elas alimentam meu presente e desenham o futuro.
Construtor da Vida, pois nos cruzamentos do destino eu escolhi o caminho por onde seguir.
Caminhos, sempre eles que nos levam ao amanhã...
E foram tantos os caminhos, tantas as bifurcações, tantas escolhas...
Mas nem só de escolhas é feito o caminho, às vezes todos eles desembocam no único ponto de onde se pode seguir.
Na falta de escolhas, optei por saltar montanhas e carregar pedras, mas atravessar, ir ao momento seguinte...
Eu vi que o amanhã era para mim, também.
Fui com medo, mas fui...
Levei no coração a paixão dos sonhos...
Plantei o que colho e planto o que colherei, talvez...
E qual o fim?
Não há fim para quem trilha, há passagens...
Por hora, me contento com os resultados de minha atividade principal: de Construtor.
Minha obra tem uma profissão que me exige, que me suga, mas que me sustenta, me acalenta, me apaixona e, especialmente, me orgulha.
Profissionalmente escolhi doar conhecimento e colher o que fosse possível, esperando ser suficiente.  Tem sido...
Tenho as primaveras, o sol, o canto dos pássaros, o céu muito azul...
Tenho amigos, bem poucos confesso, mas a quem me dedico e com quem contarei, se precisar...
Se eles estarão lá? Certezas, jamais as tive...
Tenho amor.


Não preciso mais do que posso carregar, mais do que meus braços e meu colo possam suportar, daquilo que apenas vai pesar”.  


...
Pensam que rodar "Pelos Caminhos de Jorge" foi fácil? Foi maravilhoso, mas fácil não. Dentro desse "maravilhoso" cabem lindas imagens, praias, muitas igrejinhas brancas e muitos, mas muitos sabores. E de sabores e olhares é feito o Natureza Viva, um paradouro ecológico em nossa rota rumo Sul da Bahia.


Rodávamos sem hora, só com o destino em mente, quando a fome bateu junto com aquela vontade de esticar as pernas, respirar, tomar um refresco gelado. Passamos por vários postos de combustíveis com pequenas lanchonetes, mas faltava um atrativo, uma beleza que nos encantasse. E rodamos mais um pouco, um solavanco aqui, uma panelinha ali, até avistarmos uma placa simpática, que avisava a existência de um paradouro alguns quilômetros a frente. Nisso a BR 101 se torna mais verde, a sombra das árvores refresca o ar e em meio a isso lá está ele, no Km 388 da BR 101, um oásis em meio a poluição, como bem indica o nome: Natureza Viva, sua parada ecológica. 


Saltamos felizes e já fomos entrando para ver do que se tratava. De inicio um pequeno lago cheio de Carpas, vermelhas e negras. Bom, eu já fiquei por ali, curtindo o movimento, as cores e fotografando - esqueci da sede! Há todo um simbolismo no entorno desses belos peixes com origem chinesa, mas mais conhecidos como japoneses. São sobreviventes, se transmutaram ao longo dos séculos para garantirem a sobrevivência da espécie, são guerreiros. E por essas características, deram origem a lenda do Dragão, que diz que ao vencerem o rio bravo na piracema, se transformariam em dragões como recompensa - acabaram se transformando em simbolo de força e perseverança. 


Lisboa é a cidade das 7 Colinas, dos Miradouros, local onde se cravavam as bandeiras das conquistas, de onde olhavam ao longe e sonhavam com as Terras do Novo Mundo e de onde hoje milhares de turistas observam os encantos arquitetônicos e o vai-e-vem de embarcações no Tejo. 

"Portas do Sol", designação de sonho, não? Uia, você foi a Lisboa infinitas vezes e não conhece ainda tal Miradouro? E se eu tirar um pouquinho do encanto e chamá-lo de Miradouro de Santa Luzia? 


O Miradouro de Santa Luzia fica no caminho para o Castelo de São Jorge, normalmente percorrido por quem desce daquele em direção ao Terreiro do Paço, pois para subir é melhor optar pelo Elétrico e deixar os pés para escorregarem ladeiras abaixo. 






Considero um dos pontos mais encantadores das ladeiras por onde andei, mas certamente um dos menos conservados. O espelho d'água se encontrava sujo e seco e o maior dos painéis de azulejos necessitando de limpeza e restauro. Apesar disso, a beleza se mantém e a vista é belíssima. 

Daquele ponto observamos a cúpula de Santa Engrácia, a Igreja de Santo Estevão e as torres da Igreja de São Miguel. 




Dois belos painéis de azulejos contam um pouco de história e colorem a colina. Um retrata a Praça do Comércio, antes do terremoto e, noutro, está retratado uma cena do ataque dos cristãos ao Castelo de São Jorge. Mas esses ficaram apenas na memória, pois as imagens se foram num cartão de memória perdido. 




Estive lá em duas oportunidades e, em ambas, não me furtei de gastar quarto de hora a observar ao longe, a esmiuçar os detalhes, a ver o Tejo. Daquele ponto se pode descortinar a Alfama, observar seu labirinto de ruas e becos, suas curvas, uma delicia. Depois? Se embrenhar ladeira abaixo, dobrando esquinas, observando o comércio, o passo sossegado de seus moradores até alcançar as margens do Tejo. 








Lisboa já seria uma encantadora cidade, mas seus Miradouros lhe dão charme, cores e preservam a história de lutas de seu povo, trazem um pouco da alma do lisboeta em seus jardins e em seus painéis. E como é bom poder olhar ao longe e sonhar...





Trancoso reinaria em nossos últimos dias na Bahia, dali um pulinho até Salvador, um cochilo e de volta ao Sul. Não fazia parte de meu roteirinho "Pelos Caminhos de Jorge", seriam dias quase que descompromissados. 

Meu compromisso naqueles dias seria só com o Mar, uma parada para conversar com as ondas, reabastecer o espirito, descansar nas espreguiçadeiras, antes de retomar minhas atividades, dar inicio ao ano de 2014.

E onde ficar, na Praia ou no Quadrado? Dar preferência pelo Dia ou pela Noite - pelo Sol ou pela Lua? Atividades estressantes (!) como banho de mar, caminhar nas areias e curtir o sol costumam acabar comigo, então dei preferência pela hospedagem perto do movimento noturno. Chegar cansada, tomar um banho gostoso, curtir um pouquinho o ar condicionado e ter que pegar o carro para se deslocar em meio a muvuca? Achar vaga? Melhor não arriscar, escolhi ficar pertinho do movimento noturno, a dois passinhos do mundo, no Quadrado: assim o Hotel da Praça entrou em nossas vidas.



No Quadrado, junto à badalação noturna de Trancoso, uma hospedagem de charme, colorida, quase um paraíso! Cruzar o portão e ter as mais variadas opções em bares, restaurantes, lojas e galerias de arte, além de curtir caminhadas maravilhosas no entorno do gramado, a luz da Lua e das Estrelas, foi encerrar nossa aventura baiana com gostinho de quero mais!!






"Eu vou contar uma história, uma história de espantar".
Romanceiro Popular



Com essa frase Jorge Amado inicia o maior romance acerca da formação da zona cacaueira da Bahia, publicado em 1943. E onde eu entro nisso, onde nasce minha paixão por esse livro, lido e relido mais de uma dezena de vezes? Aproximadamente 38 anos após, quando vi uma capa de cores fortes sobre a mesa de cabeceira de minha irmã (uma edição do Círculo do Livro) e, mesmo alertada de que não era próprio para minha idade o li escondidinha - o proibido sempre tem um aroma especial. Foi a primeira obra do escritor baiano a passar por minhas mãos.



As imagens criadas ainda na infância, foram se transformando, se aprimorando, dentro de uma atmosfera cada vez mais critica acerca do universo social e político que se entrelaçaram na formação da sociedade que conhecemos, até a última leitura ao final de 2013, agora mais para entrar no clima da trip. Um romance que povoou meu imaginário, que despertou em mim um desejo, inúmeras vezes adiado, de conhecer Ilhéus, seu entorno, caminhar por suas ruas.

E o dia de percorrer as "Terras do Sem Fim" chegou e rodamos por aqueles caminhos, de Salvador a Ilhéus e de Ilhéus a Itabúna (antiga Tabocas), pelas estradas, pelos pastos e plantações que se formaram nas antigas matas do Sequeiro Grande. 


Ilhéus e seus habitantes estiveram presentes no imaginário de Jorge, tanto na critica politica quanto social e são o cerne de dois de seus principais romances: Gabriela, Cravo e Canela e de Terras do Sem Fim. Ambas histórias seguiram comigo, em minha bagagem emotiva. Mas ao chegar naquelas terras, embora tudo que se veja e que se ouça seja em torno de Gabriela, eram as histórias do Sem Fim que eu vislumbrava a cada metro de estrada, a cada sede de fazenda cacaueira, a cada esquina. Então, Ilhéus foi um misto, da alegria e sensualidade de Gabriela, as tocaias arquitetadas pelos Badarós. E, a todo instante, aquela frase voltava, sempre marcante: 

"... a melhor terra do mundo para o plantio do cacau, aquela terra adubada com sangue". 

A história do Cacau se mistura a história do escritor, desde seu nascimento na Fazenda Auricina até sua mudança para Ilhéus. Alguns biógrafos dizem que a mudança ocorreu ainda na infância do escritor, devido a um surto de varíola na região. Mas o que se ouve a voz corrente e pelos guias que acompanhavam grupos pela cidade é que a família passou a residir em Ilhéus após o patriarca ser gravemente ferido em uma tocaia - sim, seu pai foi também um desbravador, um sergipano que abriu a mata e plantou uma fazenda com o fruto dourado.




Outro dia li que o uso de reticências nas redes sociais é um fenômeno bem feminino e, instantaneamente, percebi que as uso muito e pensei: devem ser meus hormônios aflorados. Mas, na verdade, não gosto de distinções de sexo, de gênero. Então por que as uso, pensei eu?

Os pequenos quadradinhos não combinam com minha escrita extensiva, espaçosa, a ser discutida, confrontada, a ser sentida. Talvez essa seja a primeira de minhas razões, mas não a mais importante. 

Os pontinhos possuem um sentido de amplidão, de abertura de possibilidades, uma forma de compartilhar os pensamentos e sentimentos, além das letras. Uma maneira de em poucas palavras igualar aquelas conversas de horas, que temos com amigos especiais, que se renovam em palavras e se perdem dos ponteiros do relógio. 

Cada vez que coloco as graciosas reticências desejo que meu interlocutor dê seguimento ao meu pensamento, o compartilhe comigo, me entenda, discorde,  interaja além do dito. Leia além das garatujas, descubra o que se esconde atrás de cada letra fria. 

Tão estreita e sem sentidos fica a Vida quando muitos são os pontos tímidos, solitários. Tão frio o entendimento ser apenas ao "pé da letra", quando simpáticos pontinhos nos permitem viajar, compreender, amar, dar cores as letras, sentidos únicos e plurais. 

Um dos muitos vícios de linguagem que carrego, mas do qual  não me libertarei, do qual sou uma prisioneira voluntária. Ao jogá-los em minhas frases, estou a lhe dar a chance de prosseguir, de se perder, de se achar, de se doar, de me descobrir ou, apenas, de pensar. 

Quando receberes minhas reticências, as tenha como presentes que dou à pessoas especiais, com quem desejo sonhar, viajar ou, tão somente, compartilhar. As tome como uma oportunidade de ir além, ou através. Aproveite o caminho, a estrada que se descortina. As postagens nesse blog estão repletas de reticências, de vãos, de espaços - são lúdicas.

Pense que deixar a porta entreaberta possa ser um dos maiores atos de doação, de Vida que se pode oferecer à um amigo... 




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