"... o que desejo é que nesta Casa o sentido da vida da Bahia esteja presente e que 
isto seja o sentimento de sua existência. 
Que ao lado da pesquisa e 
do estudo, seja um local de encontro, de intercâmbio
cultural entre a Bahia e outros lugares..."
Jorge Amado



Andar "Pelos Caminhos de Jorge" teve muito de intuitivo, nem tudo foi roteirinho na mão. Sabíamos as cidades que visitaríamos, as razões de irmos a cada uma delas e só. De resto, foi chegar e curtir, sem pressa, sem relógio e sem roteiro (sempre faço isso, com seus ônus e bônus). Assim foi com Salvador.

Estivemos na cidade em três oportunidades ao longo dos caminhos percorridos, foi nossa sede. Havia pensado em visitar a Fundação Casa de Jorge Amado no dia em que aterrizamos, mas as andanças foram jogando nossa chegada ao Pelourinho para o final da tarde, a noite caiu e a visita foi adiada para nosso retorno à cidade. 


Estaria tudo dentro do planejado se no dia da visita, depois de uma quebrada aqui e outra ali pelas ruas de pedras irregulares do Pelô, ladeira acima, ladeira abaixo, eu não tivesse apagado da memória o ponto principal do roteiro. E meu encontro com Jorge ficou para a última manhã em terras baianas, depois de muita estrada no dia anterior. Mas sabe que foi bom? Percorrer os caminhos, sentir as histórias, foi dando uma intimidade que ao chegarmos na sede azul, parecia daquelas visitas que se fazem aos amigos de longa data. Fechei meu roteirinho temático com um sabor especial (inclusive das empadinhas e docinhos da cafeteria).


O Largo do Pelourinho fervilhava no horário de almoço de um dia ensolarado, turistas se acotovelando e nós miramos a ladeira e descemos em busca da Fundação - vá que a maluca esquecesse de novo o que havia ido fazer lá, não é mesmo? Ao entrar naquela casa foi como ser recebida, efetivamente, por um casal de amigos - foi especial.


Havíamos visitado a Casa de Jorge Amado em Ilhéus, mas lá foram apenas histórias, enquanto na Fundação há Vida - você pisca e tem a impressão que eles passaram conversando, calmamente.


O Casarão é maravilhoso, junto a ladeira, com escadarias que servem de descanso aos passantes, junto a um conjunto arquitetônico bem conservado, colorido. Minhas melhores imagens da Bahia, seguramente.




Em seu interior encontramos muito das histórias de Jorge, distribuídas pelas paredes, pelas capas de seus livros expostas nos ambientes. Lá estão também muitos de seus objetos particulares, algumas de suas camisas extravagantes e características, além de seu fardão da Academia Brasileira de Letras - e que cadeira mais merecida, não acham?


Toda vez que ouço ou pronuncio a palavra "fardão" vem a cabeça, automaticamente, "Farda, fardão, camisola de dormir". Mas, no caso dele, não sem sentido. Ficção e realidade que se misturam - no livro, como na Vida.


As histórias de Jorge saíram das ruas, da vida para as páginas de seus muitos livros, um tantão de realidade, uma pitada de ficção, algumas vezes na ordem inversa, mas sempre com doses bem mescladas, para o encantamento de gerações. E vejam quem encontrei por aquelas paredes...


Embora Gabriela seja uma obra notória, para mim Jorge sempre esteve muito mais pelas páginas de Tieta, Terras do Sem Fim, Jubiabá, Teresa Batista e alguns outros - certamente por tê-los em casa e poder reler sempre que desejava. E olha que painel lindo esse de Tieta do Agreste:


Como era lúdico o trabalho: datilografado, lido, revisado, datilografado - nada de copiar, colar e deletar. A demora que ambientava, que permitia as personagens um certo amadurecimento, tempo para criar laços. Em pensar que já usei muito uma máquina idêntica a essa...


E da leitura de textos afixados nas paredes, a dedicatória de Zélia, você caminha como se estivesse batendo um papo especial com aquele amigo virtual de séculos e que somente agora teve a oportunidade de abraçar.

Zélia, daqueles amores além da Vida...


A estrutura é mega bem cuidada, os poucos atendentes são solícitos, mas não interferem na visita. Há espaços apropriados para descansar, curtir entrevistas de Jorge, de Zélia ou apenas pensar na Vida.


Para quem como nós chegou "com o estômago grudado nas costelas", há o simpático Café Teatro Zélia Gattai, com muitas delicias. Além de salgados diversos, muitos doces e, entre esses, alguns da preferência do dono da Casa: docinhos de leite, de cajú, cocadas, entre outros. Não resisti e trouxe para o Sul uma sacolinha deles para partilhar com os familiares, para que eles aproveitassem um pouco do gostinho doce que foi conhecer a Casa de Jorge.



Se você é doidinho por uma lembrancinha, uma bugiganga, no térreo junto a saída tem uma loja cheia delas: camisetas, canecas, lápis... Definitivamente, o espirito consumista não me acompanhou nessas férias!

E a sobremesa? Não foram os docinhos da sacolinha, mas um super sorvete da Cubana, logo ao ladinho.


A Fundação possui site com todas as informações para programares sua visita:  http://www.jorgeamado.org.br/







"SILÊNCIO E SOLIDÃO, O RIO PENETRA O MAR ADENTRO NO OCEANO SEM limites
sob o céu despejado, o fim e o começo. Dunas imensas,
límpidas montanhas de areia, a menina correndo
igual a uma cabra para o alto..."

* assim começa Tieta do Agreste, de Jorge Amado


Rodamos "Pelos Caminhos de Jorge", cortamos estradas, navegamos rios e, finalmente, fincamos os pés na terra de onde saiu o barro que moldou a morena mais sedutora do agreste, Tieta. 

Do Rio Real as dunas de areias dançantes, do pequenino vilarejo ao mar, com passos serenos descobrimos Mangue Seco. 




Quando decidimos cortar a Bahia, seguindo as letras de Jorge, escolhemos começar rumo Norte, saindo de Salvador pela Costa Verde, em direção a Sergipe. Fomos comemorar o aniversário de Naiá na calmaria de um lugarejo de pouca badalação, lugar de curtir o barulho dos ventos nos coqueiros, de acompanhar as marés, o vai-e-vem das águas do rio. Fomos passear pelas ruas de areia, por onde Jorge andou e se inspirou, por onde as palavras ganharam forma e se transformaram numa linda história de superações e resgate. 


Como não nos hospedamos no centrinho do pequeno vilarejo, aproveitávamos o final das tardes para visitá-lo. Uma pequena caminhada pelas margens do Rio Real, alguns passos por dentro d'água, margeando o paredão de pedras e já estávamos nas ruas de areia do povoado. Sim, um pequeno núcleo urbano no entorno de uma Capela, azul como o céu. 




Algumas poucas lojinhas e uma sorveteria, além de discretas pousadas e restaurantes, tudo muito singelo. Lugar para ouvir o vento, curtir os pássaros e deixar a imaginação voar, livre, para vislumbrar os personagens nas esquinas, pelas casas... Não foi difícil ouvir Perpétua vociferando em nome do Senhor ou sentir o perfume de Tieta trazido pela brisa que insistia em soprar. Parecia que a qualquer momento uma das écharpes da bela personagem seria levada pelos ventos e rolaria pelas areias brancas como nuvens, como na novela que tornou o livro ainda mais conhecido e que coloriu nosso imaginário. 




Sentar na varanda da sorveteria de Dona Sula, prima de Jorge ao que dizem, foi como estarmos em nossa casa, eu tomando sorvete de cupuaçu, antes de um picolé de tangerina (além de gorda, repetitiva - sim, repeti a sequência em todas as visitas). A tranquilidade do local, a simplicidade dos moradores que perambulam por ali, aquele boa tarde seguido sempre de um sorriso, nos deram uma acolhida especial. Sentadas naquela varanda, deixávamos o tempo passar, enquanto fazíamos planos para 2014, sonhadoras como sempre. Depois? Mais uma caminhadinha, a passada pelo rio já com a maré acima dos joelhos e com aqueles tons dourados que antecedem o anoitecer. 






O MAC que alimenta o espirito e o coração. Desde a mudança da sede do Museu de Arte Contemporânea de Sampa, que estava para visitá-lo. Daí uma amiga disse que o acervo ainda estava reduzido e acabei deixando para uma próxima oportunidade. E ela chegou. Se tivesse perguntado novamente acerca do acervo, talvez tivesse tido companhia na visita e a tornado ainda mais especial, mas o destino me fez curtir aqueles espaços só, eu e minha câmera - amo quando me permitem fotografar, guardar em minha memória complementar suas belezas. 

*trocadilho infame, mas que não saiu da cabeça. Desculpem!



Primeiro e mais importante para mim foi o encontro com a beleza arquitetônica, que sempre me fará retornar, embora o conjunto necessite, com urgência, de cuidados paisagísticos, limpeza e poda dos jardins. Mas a estrutura by Oscar Niemeyer está lá, agora apropriadamente ocupada - um pouco da história arquitetônica da cidade somada às artes. As ondas da pequena marquise são graciosas, se insinuam ao mesmo tempo que parecem desejar se recolher, uma lindeza. O branco característico, em meio ao verde, trocando tons e luzes - deve ser ainda mais especial com as cores das manhãs. 




Distribuídas pelos vários andares, as exposições ganharam um bom tratamento estético (o trabalho das cores nos espaços, como utilizado no Masp, seria mais impactante), em várias linhas e para gostos variados. Embora o acervo ainda não esteja disponível em peso, foi um prazer rever certas obras, certos artistas. Me encantei com algumas obras que só conhecia pelos livros de história da arte, sempre um prazer ver as pequenas imagens guardadas na memória saltarem das páginas para as paredes, como seres vivos que se libertam e se expõem em toda a sua graça para olhos curiosos, ávidos.




As exposições são vivas, se alteram e se renovam. Então, talvez, quando você chegue à essa casa, esse post já esteja desatualizado, o MAC já esteja com novas cores e novas silhuetas, mas essa tarde estará eternizada como meu primeiro "Olá ao MAC, no Niemeyer". E das exposições dessa reinauguração, curti várias, especialmente a do Di Cavalcanti, a de obras do Volpi e a de parte do acervo da Casa. 



Explorar as curvas e as cores de Di, seus jogos de proporções, de movimento, é sempre encantador. E olha que cuidado bacana na disposição dos trabalhos.... 






Para encontros e reencontros, a mescla do acervo estava especial, embora restrita. 


Encontrar Tarsilla pelos corredores.... 





Rever Chagall... 



E olha a Anita ali quietinha, com sua "A Boba"... 




Não sou muito fã, mas acabou sendo um encontro prazeroso: 



Apaixonada por história, li o material e observei as imagens da exposição "Por um museu público: Tributo a Walter Zanini", de quem desconhecia a trajetória e os serviços prestados em prol das artes. 





Há muito mais a ser visto e sentido, uns bons quartos de horas são necessários para perambular pelos andares. No espaço das doações mais recentes, há de tudo. Mas olha quem encontrei por lá!!






Um dos detalhes que mais chamaram minha atenção foi a atração que o povo tem por paredes envidraçadas - que mostram e escondem, de como um pouco de cor e forma atrai até mesmo o apressadinho. Ao atravessar a passarela, o pedestre encontra o prédio envidraçado e observa os elementos que se encontram no térreo. Olha, vi inúmeras pessoas darem uma entradinha só para fotografar com o gatão aí da foto, mega requisitado - não foi fácil ter um momento a sós com ele: 




Agora é esperar novas exposições e novas oportunidades, para aproveitar um dia ensolarado em Sampa e fazer o tour das artes pelos prédios projetados pelo Oscar, no complexo do Parque do Ibirapuera e adjacências. Ah, você não sabia?? Sabe a passarela, próxima ao prédio da Bienal?? Pois é, o Mac está do outro lado, esperando por você. 


O que dizer dessa pequena Capital com 40 graus (os termômetros de rua mostram até 47º), na sombra?? Uma delicia, com céu muito azul, sol brilhando e o ar-condicionado bombando, claro. Bom, mas a idéia desse post surgiu pela demanda de indagações acerca das condições para quem deseja visitar a cidade nesse período de férias de verão, uma vez que as noticias veiculadas dão conta de que estamos no Inferno, ao que parece. Mas nem é para tanto, tudo é tão subjetivo, não é mesmo?


Antes de explicar como funciona o clima, por essas bandas do Sul, já respondo a indagação com uma afirmação sonora: sim, dá para visitar a Capital dos Gaúchos, mesmo com 40º, bastando para tanto um pouco de coragem (hahaha)!! 

O Rio Grande do Sul possui as estações razoavelmente bem delimitadas, sendo bastante previsível o clima que será encontrado de acordo com a época do ano. Porto Alegre, especificamente, possui um diferencial: não é tão fria quanto as demais cidades do Estado no inverno, mas é imbatível em matéria de calor no verão. 

Gosto de me perder e me achar pelos caminhos, pela vida, pelas histórias, mas não pelas estradas. Quando digo que nos perdemos e nos achamos "Pelos Caminhos de Jorge", hora tem sentido figurado, hora tem sentido literal. No caso de Belmonte, o sentido é literal, mas foi encantador. 

Depois de nossa parada em Porto Seguro, decidimos fazer parte do caminho até Salvador pelas rodoviais estaduais, para fugir da BR 101 enquanto fosse possível e para aproveitarmos outros ares, novas paisagens. A escolha se mostrou sensata, rodovias melhor conservadas e com um pequeno fluxo de veículos. E as paisagens são belíssimas, lindos e extensos coqueirais, águas azuis. E assim rodamos, rodamos, uma paradinha para um passeio de Balsa, mais um pouco de estrada. As praias agitadíssimas de Porto Seguro foram ficando para trás, os povoados foram espaçando, as casas foram desaparecendo e, do nada, só coqueiros, vacas, mais coqueiros e sempre o mar azul a nossa direita, majestoso. 



Rodando, o ar condicionado bombando, musiquinha de fundo, boa conversa e apenas o GPS nos guiando, quando não ficava sem sinal, claro. Divertido, mas tão divertido, que deixamos passar nossa saída a esquerda e seguimos por mais alguns quilômetros - que falta fazem os mapas de papel, não? Mas foram poucos e surpreendentes quilômetros. Quando percebemos estávamos chegando em Belmonte: olha que bonitinha a placa! E a placa, além de nos alertar para o erro, causou aquela curiosidade, típica dos viajantes - quem aí não tem aquela coceirinha quando se depara com uma frase assim: "Cidade Genuína de Portugal"? A curiosidade nos fez seguir, doar àquele momento minutos que sabíamos que nos seriam preciosos quando a noite caísse e já estivéssemos na BR 101, saltando panelinhas. Seguimos, passamos por um conjunto mal conservado de residências, quase voltamos, mas alguns metros a frente as surpresas começaram a se mostrar, foram muitas, por muitas quadras e para finalizar o Rio, o Sol, um meio de tarde fantástico. 






Ao pensarmos as férias de verão 2014, selecionamos alguns destinos em potencial, mas faltava algum elemento, um ingrediente para a decisão. Pois bem, acordei numa manhã de outubro com a razão para escolher a Bahia: percorrer os caminhos das histórias de Jorge Amado. 


Apesar do destino de verão ter que contar com praias, dessa feita foram coadjuvantes na escolha do roteiro por terras baianas. Não houve preocupação com as eventuais belezas dos destinos, a intenção passou a ser a de dar cores, aromas e sabores às letras de Jorge. E foi o que fizemos, ao longo de 12 dias. 

O roteiro ficou apertadinho, distribuído de Sul a Norte, de Norte a Sul. Nos perdemos em muitos quilômetros, em muitas curvas e nos deixamos surpreender.  


Andamos pelos caminhos de Tonico Bastos, dos Badarós, de Gabriela e de Tieta. Demos tons ao imaginário, retiramos das páginas de "Terras do Sem Fim", de "Gabriela, Cravo e Canela" e de "Tieta do Agreste" os personagens e os jogamos na Vida, nas ruas e nas areias da Bahia. De certa forma, nosso olhar desbravou caminhos que para nós já eram em parte conhecidos, imaginados. Das tocaias pelos caminhos entre Ilhéus e Itabuna, às areias dançantes por onde Tieta desfilou sua ousadia. Da Fundação Casa de Jorge Amado no Pelourinho, subindo a Mangue Seco e descendo a Ilhéus. De Norte a Sul, uma aventura medida em quilômetros e feita de muitas histórias, de felicidade e companheirismo. Histórias que povoarão essa Casa ao longo do tempo, na medida da inspiração, de forma que as muitas letras que por aqui chegarem tragam a emoção dos momentos vividos, das pequenas descobertas, da gente daquelas terras. Histórias nascidas de emoções, de cores e de muitos sabores.  






Janeiro, Sol e Mar. Sinônimo de Férias e o Mochilinha coloca os pés na areia, dá uma parada para conversar com as ondas, para viver e colher novas histórias, para dar vazão às emoções, para dar cores, cheiros e sabores as letras de Jorge (bom, isso explicaremos na volta, é claro). 

Na bagagem apenas desejos de um ano repleto de novas aventuras, de muitas histórias, de belos relatos e de muita interação. Mas não paramos, porque as histórias são vivas, transcendem ao tempo e estão espalhadas por essa Casa, uma casa de portas sempre abertas para os amigos e para aqueles que vão chegando, trocando idéias, curtindo histórias e imagens, viajando conosco. 

Partimos pelos caminhos de Jorge, até breve...


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